Domingo é um dia reflexivo, pensativo. Não raras são as ansiedades geradas pela segunda feira que se aproxima, mas ainda é fim de semana. Nas férias este peso é menor, pois o início da semana é mera formalidade. Foi em um destes domingos, cujo peso da segunda-feira inexiste, que resolvi arrumar gavetas. Ao longo do tempo, muitas coisas são guardadas. Algumas para comprovar pagamentos e cumprimentos legais. Outras para relembrar momentos significativos (muitas, talvez a maioria). É o tíquete de um show inesquecível, tipo Paul McCartney. É o comprovante de passagem daquela viagem marcante. É a flor seca dada por um amor que, talvez, já tenha deixado de ser.
É o desenho, o caderno do filho. O boletim do primário, amarelecido, que guarda a assinatura da primeira professora. É um botão, um clipe, um pregador que por algum motivo, foram cuidadosamente mantidos. É importante mexer nas gavetas para descartar o que não mais importa. Aquilo que perdeu o significado com o passar do tempo. Limpar gavetas é uma forma de se desprender do passado, de pessoas e de fatos que podem, hoje, representar apenas peso na memória. São guardados que deixam de estar associados à felicidade. Memórias de felicidade são essenciais. Nestas reviradas de gaveta encontrei uma cartinha dirigida ao Rogério por ocasião de sua formatura em engenharia. No sábado eu havia participado da solenidade de formatura em química dos meus alunos. Formaturas sempre me emocionam grandemente, apesar das dezenas que já participei. Me emociono ao observar os rostos ante sonhos realizados, ante à esperança estampada nos olhos de todos. Por este motivo resolvi ler a cartinha encontrada. Ela estava carregada dos mesmos sentimentos e dos mesmos desejos que formulei aos meus alunos, durante a cerimônia - "que os conhecimentos adquiridos no decorrer dos anos, agora ao alvorecer de uma nova etapa, sejam aplicados na prática. Vá em frente e seja feliz".
O registro da data demonstrou que se passaram quarenta anos, mas a UFSM continua emocionando, transformando realidades e proporcionando felicidade. Encontrei também a edição histórica de uma revista que trazia os principais fatos e pessoas marcantes do século XX, pois o século XXI batia à porta. Folheando as páginas bem conservadas, muitas previsões - pane nos computadores do sistema bancário (bug do milênio), novas guerras e outras dificuldades. Mas, também encontrei registros de que o século XX foi prodigioso em conquistas tecnológicas. O flagelo da guerra que matou 188 milhões de pessoas pelo uso da energia nuclear, ainda hoje assombra nossas vidas. Meus guardados mostraram que sonhos coletivos ainda precisam ser conquistados inspirados talvez, na luta pela paz de Nelson Mandela, um dos grandes personagens do milênio: "Marcadas nestas pedras você vai encontrar a dor de nossa luta, as tristezas de nossas perdas e os alicerces de nossa vitória".